Violência urbana


Direito à segurança e direito à cidade

Lúcia Siqueira

Direito assegurado pela Constituição de 1988 , celebridade nos meios de comunicação, nos trabalhos acadêmicos, projetos institucionais e plataformas eleitorais, a segurança, ou melhor, a falta dela, é uma das principais preocupações da mulher e do homem urbanos que condiciona a forma de viver e conviver na cidade.

Mudança de trajetos, horários, uso dos espaços públicos e forma de lazer são exemplos das alterações de comportamento mais freqüentes. Em paralelo e/ou em conjunto com isso, as cidades vêm concretizando esse novo fenômeno, gerando novos modelos de relações pessoais e espaciais que têm como expoentes máximos a segregação social e espacial. Este texto tem como principal intenção refletir sobre a busca individual de segurança e o direito à segurança coletiva no espaço urbano.

Baseados em...

Antes de iniciarmos nosso propósito, faz-se necessário deixar claras as bases do nosso raciocínio. Primeiro, adotamos que a segurança deve ser considerada um direito de cidadania, pois significa liberdade (respeito ao indivíduo) e ordem (respeito às leis e ao patrimônio), que são fundamentais para o desenvolvimento econômico e social.

Segundo, por violência entendemos que “é todo ou qualquer ato ou omissão praticado individual ou institucionalmente contra o ser humano, que viole sua inteireza e individualidade física, moral, psicológica, emocional, sexual, étnica, cultural e social” .

E terceiro, “classificamos” a violência em dois tipos: a violência vermelha e a branca . A violência vermelha é caracterizada por atos como assassinato, roubo, estupro, ou seja, qualquer ação que viole a integridade física de uma pessoa. Já a violência branca é aquela sofrida por pessoas que não têm acesso a direitos como moradia, trabalho, educação e saúde. Nesse processo, muitas vezes a violência vermelha torna-se a forma imediata de resposta à violência branca sofrida, uma passa a ser causa e/ou conseqüência da outra.

Segurança, um produto lucrativo.

Os custos com a segurança para o Poder Público acarretam gastos monetários e sociais significativos . A aplicação dos recursos na construção e manutenção da estrutura penitenciária, núcleos de segurança, compra de tecnologia de ponta de serviços de informações (muitas vezes pouco trabalhados pelos policiais) não trazem, na maioria das vezes, respostas concretas ao cotidiano da maioria da população. Conseqüentemente, isso leva a um desgaste da credibilidade das instituições públicas.

Para o setor privado, a busca por segurança e o medo da violência vem a cada ano abrindo portas para um mercado bem lucrativo. Como as respostas à coletividade, de responsabilidade do Estado muitas vezes são frustrantes e pouco ágeis, a resposta individual parece ser a forma mais rápida e eficaz de se ter segurança.

Para isso, vende-se circuito de TV, vende-se alarme antifurto, vende-se sensor de movimento, vende-se carro blindado, vende-se cerca elétrica, vendem-se detectores de metais, vende-se a “idéia de segurança!”.

Para se ter uma idéia, nos últimos dez anos ocorreu um aumento alarmante de consumo de dispositivos de segurança que vão desde guarda-costas até prédios dotados de diversos esquemas de proteção. Em 1995, as classes média e alta do Rio de Janeiro e São Paulo despenderam cerca de 15% do seu orçamento familiar anual com segurança .

Estudos realizados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) afirmam que o número de seguranças particulares hoje é três vezes e meia maior que todo o contingente das forças armadas nacionais e que os custos com a violência atingem 10% do PIB, algo em torno de R$130 bilhões.

O mercado imobiliário também soube tirar proveito desse novo filé do mercado. Área do apartamento e quantidade de vagas não dão mais aquele status de antigamente, o mais vendável hoje é o apartamento com guarita e circuito interno de tv. Mas, qual a conseqüência disso na cidade?

E a cidade, como é que fica?

Presídio Professor Aníbal Bruno, Curado. Doze câmaras de vigilância eletrônica, muro de seis metros de altura, cerca elétrica, nenhum sistema detector de violação. Função: retirar do convívio social pessoas que, teoricamente, representam ameaça à coletividade.
Edifício Hockenheim, Jaqueira. Dezesseis câmaras de vigilância eletrônica, muro de oito metros de altura, sistema infravermelho com sete pontos de detecção, acionamento remoto de patrulha de segurança. Função: proteger seus moradores de pessoas como as que se encontram no Aníbal Bruno.”

O texto acima exemplifica bem o que vem acontecendo com as nossas cidades. Atualmente elas estão passando por um processo de mudança de organização social, gerando novas formas de relacionamento e novos desenhos no espaço urbano, enfim, o que muitos autores denominam de segregação espacial.

Na busca por proteção e segurança, os moradores das grandes cidades passaram a adotar soluções privadas de proteção e passam a se “aprisionar” em suas casas e, progressivamente, (diante do sentimento de insegurança da cidade) abandonam o espaço público. No entanto, esse tipo de reação imediatista, individualista e anti-social só alimenta mais a violência e, conseqüentemente, a insegurança.

Um bom exemplo disso são os "condomínios exclusivos”, com maior difusão no Rio de Janeiro e São Paulo. Esses oferecem dentro de seus muros, além de comércio, serviços e lazer, o fator segurança. Porém, não só “encarceram” seus moradores como acentuam a desconfiança de quem está do lado de fora.

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